quinta-feira, abril 18 2024

true detective 2z03

[com spoilers do episódio 2×03] Em épocas pré-Netflix, pré-HBO e pré-popularidade de séries no Brasil, quando Malhação era a referência audiovisual da galera jovem e descolada, logo identifiquei um artifício recorrente no folheteen (sic): terminar um episódio com uma cena bombástica e, no início do episódio seguinte, criar alguma saída mequetrefe para invalidar a tal cena bombástica e fazer a trama seguir como se nada tivesse acontecido. Dessa forma, aquele dominó de romances adolescentes que começam errado por epidemia de estupidez podia atirar cliffhangers eficientes sem se comprometer com eles.

O que True Detective fez entre Night Finds You e este Maybe Tomorrow é emular Malhação. O suspense deixado pela encontro semi-ornitólogo de Velcoro foi prontamente apagado por borrachas (literalmente) antes dos cinco minutos, o que acaba dando uma aura indestrutível aos protagonistas (péssimo para uma série que pretende construir alguam tensão e sensação de perigo). Só não piso mais com a bota no rosto dessa decisão porque dela resultou a linda cena inicial do terceiro episódio, talvez a melhor da temporada até aqui (e também seguindo uma tendência que, ao menos na minha experiência, começou com LOST: fechar um episódio com alguma cena impactante e iniciar o seguinte com algo que não possui absolutamente nada a ver com nada). Aliás, com exceção da malhaçãozada, Maybe Tomorrow traz grandes melhorias na narrativa da segunda temporada: esperto, conciso e intenso, abre mão dos vícios dos episódios anteriores para fazer a trama deslanchar.

Assim, surge com diversos diálogos inspirados (“álcool te deixa de boa e eu não quero perder a raiva“, “chupe o seu próprio pau“”), cenas de ação eficientes – embora nada realmente épico (ficamos mal acostumados com aquele plano sequência do 1×04) – e uma atmosfera onde as personagens respiram noir ao invés de oxigênio. Passadas as (desnecessárias) complicadas explicações, a temporada assume um tom mais objetivo e começa a desenvolver a trama, a caminhar com as próprias pernas – por exemplo, a aparição de um novo mascarado dá fôlego ao mistério, enquanto Velcoro e Bezzerides parecem flertar com uma aliança aberta e honesta no meio da vastidão de interesses. Além disso, as investigações se tornam o ponto central (particularmente gostei da cena envolvendo o filme) e as coisas acontecem organicamente ao redor disso, e não o contrário.

Porque uma coisa que Maybe Tomorrow faz é se aprofundar mais nesse quarteto de complexos freudianos que protagoniza a temporada: a sugestão da homossexualidade de Woodrugh, tão bem plantada em Nigh Finds You (conforme falamos na crítica), evolui e apresenta tanto motivações quanto sintomas; Frank busca na violência da sua vida antiga compensar a impotência que vive, e parece sentir falta da violência; a lealdade de Velcoro ao filho e a ilusão de troca de mensagens e construção de aeromodelos sugere algo realmente patológico, quase esquizofrênico (e, observando a relação fria com o pai, surge como uma tentativa de não repetir os erros), o que de certa forma dá ao detetive e a seu bigode um caráter mais sensível e imprevisível; e Bezzerides é ilustrada como emocionalmente estéril, dada a frieza com que diz que gosta muito do policial como amigo, reforçando suas características de objetividade e eficiência (e o toque de fazer a moça fumar um cigarro eletrônico, sem precisar se comprometer com o vício ou a abstinência, é brilhante. Se comprometer não é com ela).

Com tudo isso, a segunda temporada finalmente conseguiu estabelecer um universo de personagens, possibilidades, conflitos, alianças, interesses e máscaras. Conhecer mais sobre as personagens é sempre um convite a se envolver mais na  trama, e True Detective parece ter engrenado nesse caminho, ainda que com timidez – entretanto, a possibilidade de arcos narrativos intensos com a dualidade entre o caos e TPM ocasionais de Velcoro e a frieza de Bezzerides deixa a série com o queijo e o cortador de queijo na mão. Até aqui, o grande diferencial da temporada vem sendo apenas o nome e as atuações, mas Maybe Tomorrow deixou tudo tão azeitado que quase dá para esquecer da malhaçãozada lá no início. Quase.

4star

10 comments

  1. Na minha opinião a série tá tendo uma
    Evolução…
    Boa crítica..

  2. A cena na mansão foi muito mais “Malhação” do que qualquer outra coisa,
    pra mim, este foi o episódio mais fraco até aqui.

  3. Ainda não me pegou…
    Dou duas estrelas e meia e olhe lá.

  4. Quando o segundo episódio acabou eu pensei “Se o Colin Farell morreu eu parei com essa série”, quando chegou segunda-feira e fui ver o episódio pensei “Se o Colin Farell não morreu, eu parei tbm é demais levar um tiro de espingarda e ficar vivo”, dito e feito, não iam matar o ator mais importante da série. Pra mim chega, talvez no futuro, quando a temporada tiver terminada eu baixe tudo e assista. Comecei a assistir de novo a primeira temporada, é incrivel a qualidade dela, fiquei totalmente preso desde os primeiros minutos, mesmo ja sabendo a historia.

  5. Primeira..temporada
    Nem se compara muito mais irada..
    Agora sobre o tiro que Farrel levou,não era chumbo era outro material tipo borracha..ele explica no ep.

  6. Que decepção com esta 2ª temporada. Toda atmosfera construída ao longo da 1ª, diálogos, atuações, situações, adrenalina, tudo o que era bom e fazia a série ser ótima como um todo, neste ano está em falta. 4 protagonistas e nenhum deles com nem ao menos 1/3 do carisma de qualquer um dos dois protagonistas da temporada passada. Vou dar uma chance pra essa série até o 5º capítulo, mas dependente do que acontecer no próximo ep (4º), já desistirei. Tem muitas outras coisas boas para assistir ao invés de perder 58 min por episódios fracos dessa temporada.

  7. Bem aquém da primeira temporada… mas ainda tenho esperanças que deslanche.

  8. O desenvolvimento é mais ordinário do que na primeira temporada, isso é verdade: mas basta criar um pouco de confusão, e a trama vai se parecer valiosa. Por outro lado não há aqueles discursos autocomplacentes, aquela filosofia de segunda mão e o falso simbolismo que me importunavam tanto assim na primeira.

  9. Imperdoável o final do episódio dois e depois aquela resolução sem sentido.

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