quinta-feira, março 28 2024

Produção do grupo Parafernalha para a Netflix demonstra potencial subaproveitado

atocaEm determinado momento de A Toca, produção da Parafernalha para a Netflix, é dito que “humor inteligente é para poucos“. De fato é. Mas antes de falar da série, preciso esclarecer que (i) críticas sempre são parciais e (ii) não gosto do Felipe Neto. Não como ator, mas como opinador em seu canal Não Faz Sentido no YouTube, onde, a meu ver, usa um discurso simplório com rebusque eloquente para transmitir ideias politicamente equivocadas. E isso, é claro, contribui e muito para que eu assista A Toca com inicial má vontade. Mas tentei ao máximo separar minha opinião do protagonista daquela do produto veiculado. Na sitcom, Felipe Neto e a equipe da Parafernalha usam o formato mockumentary para contar a história do dia a dia da própria produtora, mesclando com esquetes que produzem. Competente como intérprete, Neto surge em tela mais neutro que em seus vídeos raivosos, demonstrando o carisma inegável que possui enquanto apresenta a rotina de sua empresa. Mas o primeiro tropeço de A Toca começa no próprio formato que jamais se estabelece nos três capítulos produzidos, denotando falta de experiência e timing com a linguagem televisiva.

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A série não sabe se conta as histórias da produtora – como a da chegada do novo montador (Otávio Ugá, ótimo) que tem um estilo peculiar e renderia uma boa trama – ou se envereda em veicular suas criações. Desperdiçando as dinâmicas que renderiam interessantes momentos em tela e que são o mote da série inspiradora, The Office, Neto e equipe gastam boa parte dos 20 e poucos minutos disponíveis com esquetes cômicas no estilo Porta dos Fundos. Estas, aliás, com punchlines que demoram para vir (a do parabéns, por exemplo) ou que jamais chegam (a da agência de viagens). O tom do humor também não se estabelece, às vezes fazendo piadas ofensivas estilo Rafinha Bastos apenas por ser (como as do nordeste, aquela com deficiente e até mesmo com um péssimo uso de blackface) e outras vezes infantis (no último episódio, Neto fica mais de um minuto à frente do computador ouvindo uma música de Sandy e Júnior fazendo caras e bocas).

Apenas no terceiro capítulo A Toca demonstra esboçar uma conexão metalinguística entre o que é retratado na empresa com as esquetes produzidas. Uma produtora até comenta como fazem para superar um problema técnico – algo que seria interessante de ser retratado -, mas isso logo é abandonado e o formato inicial é retomado. Veiculam também, por exemplo, uma piada política que ensaia uma crítica à igreja evangélica e à comissão de direitos humanos presidida por Marcos Feliciano, mas que no fim é entregue de forma vazia e sem destinatário. Outras ideias, como a boa sacada dos Power Rangers estarem sempre se mexendo para identificarmos quem está falando ou a clara inspiração a Wilfred na esquete do cachorro, logo viram uma piada arrastada e sem graça. A Toca prova que é capaz, sim, de se fazer uma série para a TV com recursos limitados de uma produtora para a Internet (os atores são  competentes  e a produção é caprichada para o padrão proposto), mas nesta primeira tentativa os méritos são mais técnicos do que criativos.

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