quarta-feira, abril 24 2024

newsroom 3x02

[com spoilers do episódio 3×02] Run, a segunda investida de The Newsroom nessa (pause solene) última temporada, é aquela clássica história “garoto encontra garota, garota é viciada em bolsa de valores, garota descobre uma possível compra da empresa, computadores, referência a The Godfather, invasão do FBI”. Pode parecer meio bagunçado, mas Aaron Sorkin se transforma em um Winrar humano e junta tudo em uma trama fluida, ainda que problemática aqui e ali.

O melhor continua sendo a alergia que The Newsroom tem a simplificar as coisas, pois a série utiliza suas personagens para discutir os dois lados de uma questão sem que um seja o mocinho e outro o vilão – e aqui a questão é, obviamente, Neal parar no xilindró, algo que coloca a ética da imprensa (“se não fizermos nada, o trigésimo nono será por nossa conta“) contra as consequências da decisão (e frases como “quando há um vazamento, nossas fontes são executadas“). Run joga os dois pontos de vista no ar e, embora a tendência seja torcer pelos discípulos de Gutenberg, cabe ao espectador refletir sobre quem está certo ou errado (se é que há um certo e um errado. O importante são as questões. É tipo o que Prometheus tentou fazer, mas, sabe, com sucesso).

Já a decisão altruísta de Neal, embora pareça um tsunami de utopia, reflete a visão de liberdade a qualquer custo que a personagem sempre teve (a história que ele conta em Amen, na primeira temporada, já o identifica dessa forma). Aliás, é interessante perceber também como Will cresceu ao longo da série, assumindo o papel de “só por cima do meu cadáver” entre a equipe e as ameaças (algo que reflete as cicatrizes psicológicas do Will, conforme também visto na primeira temporada), mesmo que isso signifique abraçar uma granada sem pino em um ônibus velho cujo motorista está atrasado nos horários. Impossível não querer invadir o set e distribuir packs de cervejas para a galera.

Para não deixar o episódio muito viciado no lance de espionagem, a trama envolvendo Neal, bem construída por apresentar aos poucos os fatos e as consequências (Neal pode ser preso, ele quer seguir em frente do mesmo jeito, uma agente do FBI diz que a Lei de Espionagem é tipo a segunda página de resultados do Google e ninguém se importa com ela, Will continua discordando da ideia – o que mina a confiança do espectador, a advogada continua tocando o terror, etc), alterna ao longo do episódio com outras desventuras. E claro, elas não possuem a mesma intensidade da narrativa principal, até porque nenhuma delas oferece a esperança de que a coisa descambe para um filme do 007, mas possuem diversão (Don e Sloan) e um pouco de conflito (Jim e Hallie. Ainda que pode ter sido só um movimento para se livrar da moça) suficiente para validarem seu passaporte (na real, Maggie emulando um Before Sunrise jornalístico não é exatamente uma injeção de empolgação, mesmo com a mensagem ética e tudo mais. Passa por média).

Run tropeça mesmo é quando mostra Reese brigando com seus meio-irmãos pela sobremesa (uma sobremesa de bilhões de dólares). As cenas em si até funcionam bem porque Sorkin escreve diálogos com tinta feita de inspiração (“eu sou um babaca do lado dos anjos“). Só que é difícil engolir Reese e Leona rodando a baiana para defender valores que até pouco tempo atrás eles não se importariam em usar como matéria prima para fazer sapatos, uma vez que nunca houve um grande investimento nessa mudança deles. Tudo bem, é aceitável, a suspensão da descrença consegue varrer para baixo do tapete, mas não há como realmente se engajar nos eventos, já que a coisa toda soa muito pontual, muito súbita. Tipo, um belo dia eles acordam e precisam de quatro bilhões para salvar a empresa. É o tipo revelação forçada com a qual talvez só o Eike Batista se identifique.

O elenco, como sempre, permanece em chamas, conseguindo a façanha de reproduzir os diálogos brilhantes (“posso ser mais bundão do que qualquer um no estado“) e respirar ao mesmo tempo. A interação entre as personagens é simplesmente fantástica, e cada episódio de The Newsroom é sucedido por um balançar negativo de cabeça e pelas palavras “por que não posso ser amigo deles?”. Entretanto, Run atinge níveis apoteóticos mesmo é no seu final, uma utilização inteligente da pista-recompensa (Sorkin é mestre nisso) que mostra a inteligência de Will, a cumplicidade entre ele e Neal e deixa um excelente gancho para o que vem pela frente.

4star

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