De uma hora pra outra, doze naves alienígenas decidem utilizar a Terra como estacionamento, todas elas tendo o formato de algo que você usaria para segurar a porta da cozinha. Como inglês não é matéria obrigatória na via-láctea, a dra. Louise Banks, referência mundial em línguas (no sentido acadêmico), é chamada para descobrir exatamente qual é a desse pessoal.
A Chegada é uma experiência engrandecedora. A ficção científica tem liberdade para correr solta no parque dos temas humanos, e o novo filme de Denis Villeneuve segue a mesma filosofia. Concisa, intensa e incrivelmente bem contada, a produção é um daqueles acertos que atiram o espectador para fora da sala com a cabeça em profusão e o coração apertado. Do tipo que a gente recomenda para os amigos e no dia seguinte já sai cobrando se eles já assistiram.
Villeneuve comanda a coisa toda de forma cadenciada. As câmeras se movem devagar, e o diretor sabe construir bem a antecipação do encontro – além do recrutamento, há a caminhada pelo acampamento, os exames médicos, o transporte e por aí vai. A Chegada divide com o público tanto a curiosidade quanto o maravilhamento com a situação, contrastando a parte operacional (acampamento, corredores claustrofóbicos, computadores, objetivos) com a imponência das naves (a chegada de helicóptero até o local é linda), frequentemente enquadradas em contra-plongée por motivos de acima do nível do mar. A primeira visita, por exemplo, combina a empolgação de Ian com a preocupação de Louise, resultando em uma cena maravilhosa onde a gravidade se transforma em um cavalo louco, mas são os pequenos detalhes (a respiração ofegante da tradutora, o sorriso no rosto do cientista) que dão um significado maior ao momento. Isso envolve o espectador na atmosfera do filme, que ganha em emoção justamente porque o público compartilha da expectativa das personagens.
O próprio design de produção se junta a esse time, criando uma antecâmara totalmente vazia para os contatos, o que mantém o foco em Louise, Ian e os visitantes espaciais. A partir daí, a abordagem científica começa a atirar insights alucinados que revelam a inteligência daquelas personagens: e se a língua falada dos alienígenas for diferente da escrita? E se não perceberem a existência da mesma forma? Como traduzir uma comunicação visual que talvez nem faça sentido? O roteiro é hábil ao explorar as dificuldades encontradas pelos cientistas, conferindo um tom de progresso aos acontecimentos que faz a narrativa andar para a frente. Ao mesmo tempo, cria uma sensação de urgência graças à insanidade militar de resolver tudo na base do soco na cara e na completa falta de diplomacia dos países frente à incrível situação. Isso meio que acaba tornando a película ainda mais atual, principalmente em tempos de Trump.
Ajuda também ter uma Amy Adams como protagonista, empregando todo seu talento para conferir vulnerabilidade e admiração à Dra. Louise Banks. A atriz consegue fazer a linguista mergulhar de forma natural nos mistérios de outro planeta, acompanhada de um Jeremy Renner empolgado e sorridente (e é incrível que no meio de tudo o filme ainda tenha tempo para investir em cenas onde ambos se conhecem um pouco mais). Afinal, é uma obra sobre temas humanos, e os dois cientistas são a agulha de humanidade no palheiro militar cheio de agressividade à flor da pele onde os alienígenas se encontram (não à toa Louise e Ian são os únicos que realmente se “mostram” aos visitantes, retirando o traje de proteção).
Pois quando a narrativa se torna mais complexa, é esse carinho e empatia que temos por Louise que cria o impacto do terceiro ato. É a descoberta de algo novo sobre aquela mulher, um tipo de amor que não encontra paralelos em nenhum outro. O intrincado roteiro se fecha redondinho, cada peça compondo um desfecho preciso, e consegue ir além: faz o público refletir sobre as decisões que tomamos na vida, a inevitabilidade das coisas, a importância de uma certa empatia para aproximar as pessoas e a quantidade acachapante de dor que o ser humano consegue aguentar por alguém que ama. E o filme não explica isso, ele provoca isso. É um golpe fortíssimo. Desorientador. Daqueles que ficam marretando a cabeça muito tempo depois do final da projeção. E é também o que torna A Chegada uma obra tão espetacular.
Assisti hoje cedo e vamos ser realistas: o filme é bom mas eu podia ter assistido em fast forward que eu acho que não ia fazer diferença…
E de quebra ia ter economizado meu tempo. :P
“enquadradas em contra-plongée por motivos de acima do nível do mar.” Seria interessante escrever o texto numa linguagem mais prática ou ele está voltado apenas para cineastas e estudantes de TV?
tbm fiquei com essa sensação, se tivesse assistido os ultimos 20 minutos ja tava bom
Não é nem querendo defender e tudo mais, mas, pra ser bem honesto, bastou 30 segundos e uma busca no Google pra entender o que é o termo…
OK mas quando se le uma critica de filme, o leitor deve entender a critica de forma plena. Na minha opinião, claro.
Se o blog é aberto a todo tipo de público, não vejo porque usar uma linguagem técnica pouco usual…imagina se estivesse escrito numa revista, o leitor deveria pegar o celular e pesquisar na internet o que o crítico quis dizer? Pra mim, não faz sentido.
Claro, claro. Não tiro sua razão. De fato se fosse numa revista, seria um saco buscar cada ‘termo’.
Pois é. Fica minha sugestão para que o autor do artigo reveja o procedimento nos próximos artigos, para que a mensagem chegue a todos sem distinção.
Villeneuve é sem dúvida um dos melhores diretores da atualidade, nunca faz filme ruim.
Nem é uma coisa tão complicada. No mínimo é um estímulo a buscar e aprender algo mais.
Mas é irônico ver esta queixa em uma crítica de um filme que fala sobre comunicação.
Complicado ou não, minha crítica foi somente pq o autor usou uma expressão técnica sem explicá-la. É isso que se faz quando se publica um artigo ou reportagem, ainda mais em um site com publico amplo como esse. Não conheço a trama do filme mas se é sobre comunicação, acho que neste caso ela foi falha.
Você conseguiu colocar em palavras tudo o que senti. O aperto no peito foi tão absurdo que entrei no meu carro após assistir e filme e chorei. Ele tem um profundidade tão intensa que não é todo mundo que está aberto para realmente deixar o filme ser tudo o que deveria ser. Simplesmente um dos melhores filmes que já assisti e não falo isso com a visão de uma ex estudante de cinema, mas com alguém que se entregou de corpo e alma à experiência.
Assisti hoje e estou maravilhado, provavelmente assistirei outras vezes (utilizando bastante o pause e o slowmotion em algumas cenas). Não é um filme para ser apenas visto, passou a ser uma referência no tema, é um filme que está na categoria de obra de arte. Eu que tomei um susto quando assisti “Insendios” do Villeneuve pela tamanha intensidade, não tenho a menor dúvida do grande diretor que ele é depois de assistir A Chegada.
Gostei muito da abordagem feita neste blog, mas vi muito mais que a técnica utilizada pelo diretor.
Já estou atrás do livro “História da Sua Vida e Outros Contos” de Ted Chiang para fechar meu conceito sobre o filme. Saudações.
Assisti e concordo plenamente com o André. O melhor filme que assisti em 2016 sem sombra de dúvida… assistirei mais de uma vez… super recomendo
Realmente para quem esta acostumado a roteiros de holywood, o filme parece lento. Mas o filme consegue trabalhar muitos temas que a maior parte do público não se da conta. É um filme muito sensorial e excelente por isto.
Pra mim ficou a sensação de um episodio de Lost. ..flashforward e choradeira…e jump! !!
Interestelar vai ser referencia de FC true por muitos anos…
Que absurdo… não assisti Lost e nem preciso, afinal, todo mundo sabe que a parte boa de Lost é aquela que foi dirigida pelo J. J. Abrams, ou seja, o piloto, hehehehehehe.
A Chegada é uma obra de arte, não pode ser apressada.
Que absurdo… não assisti Lost e nem preciso, afinal, todo mundo sabe que a parte boa de Lost é aquela que foi dirigida pelo J. J. Abrams, ou seja, o piloto, hehehehehehe.c
A Chegada é uma obra de arte, não pode ser apressada.