sexta-feira, março 29 2024

orange sticker2

[com spoilers do episódio 2×04] Eu imagino Damon Lindelof e Tom Perrota olhando para The Leftovers com orgulho e dizendo “olha como cresceu rápido“: assim como seu predecessor, Off Ramp, Orange Sticker é uma exibição de segurança, concisão e maturidade. Consegue tocar a história e polvilhar mais alguns mistérios no ar sem deixar as personagens de lado – ou melhor, se aproximando muito daquelas pessoas e com um cuidado incrível.

O resultado é um dos episódios mais sensíveis e tocantes da série. Da cena inicial onde descobrimos que Nora é alérgica à palavra “gone” (e acompanhar o desespero dela é algo que abre uma rachadura no coração) até o belíssimo plano final, onde Michael está tirando o tal adesivo laranja, Orange Sticker constrói uma narrativa intensa e cuidadosamente desenvolvida. Pistas são jogadas de forma natural na história e resgatadas depois (a conversa onde Michael explica a Jill sobre o adesivo é o que dá força para o plano final; o desespero de Nora é o que constrói o significado das algemas), e as interações parecem pertencer à história pessoal de cada um, jamais soando artificiais ou como uma desculpa para fazer a carroça se mexer. Praticamente nada destoa da atmosfera proposta.

Afinal, aqui acompanhamos a situação chegando ao limite para três personagens: John, que viu a filha desaparecer; Nora, que reviveu o trauma; e Kevin, o sonâmbulo suicida. Mas não há um dramalhão descontrolado, e sim uma busca por vingança, esperança e iluminação, pois os três possuem pilares de suas vidas terraplanados (a filha, a sensação de segurança e, bem, a vida, respectivamente) e suas ações desesperadas são mais do que justificadas pelos acontecimentos anteriores do episódio ou da série. Mais do que isso, envolvem o espectador porque The Leftovers decidiu mostrar as coisas, ao invés de simplesmente informar – assim, sabemos o quanto significa para Matt o vislumbre de cura da esposa, sabemos quanto confiança Nora deposita nele, sabemos o quanto ela precisa se sentir segura e sabemos que nossos sistemas lacrimais estão funcionando corretamente quando eles se abraçam.

orange sticker1

Grande parte disso se deve às atuações vitoriosas de Justin Theroux, Carrie Coon, Kevin Carroll e Christopher Eccleston, que investem em trejeitos mais contidos para não deixar a coisa escorregar para o caricato e conferem uma vulnerabilidade cativante a suas personagens. Fica fácil sentir por elas e se importar por elas. Até porque sabemos que a metafísica ligou o modo “hard” para as pessoas naquele universo e que a situação é meio que ninguém sabe de nada e vamos torcer pelo melhor. Inclusive, o sumiço em Jarden pode apontar os “imigrantes” como problema (se não para os espectadores, pelo menos para os habitantes, criando aí mais uma subtrama interessante), e Orange Sticker ainda consegue apresentar mais momentos interessantes relacionados aos mistérios originais – no caso, como Michael sabe que a irmã se foi, como Virgil conhece o sofrimento de Nora, o fato do sujeito louco também enxergar a Patti e, claro, o conhecimento da própria Patti. Aliás, o episódio mostra que manja muito ao usar a cena do celular para estabelecer que Patti sabe das coisas e, assim, criar suspense (“não entre no carro“) e até mesmo informar o paradeiro das moças (e foi brilhante colocar ela, no início, dizendo que sabia a resposta e deixar Kevin ignorando a ex-viva o tempo todo. Quase tive um choque anafilático de curiosidade e uma ou duas vezes gritei para a televisão “pergunta, cacete!”).

Tropeçando só na utilização excessiva da trilha, que não dá muito respiro (mas a utilização da música de Grease – em uma versão melancólica – me encucou, admito), na tagarelice um pouco excessiva de Patti e em uma ou outra invencionice (o enquadramento que vira de cabeça para baixo quando Nora desmaia), Orange Sticker mostra The Leftovers muito mais focada, muito mais atenta às suas próprias possibilidades. Não é qualquer série que despeja uma panorâmica tão tensa quanto aquela do final e não é qualquer série que consegue representar tanta coisa com uma simples algema, cena tão sensível e poderosa que ainda não consegui tirar o gosto que deixou na minha boca.

5star

 

7 comments

  1. Acho impressionante a boa vontade dos críticos para com esta série apenas mediana, que se esforça tanto pra ser uma Lost, e não consegue. É verdade, ela tem uma ótima condução técnica, mas uma história arrastada, insossa e deprimente, e assim como seus personagens, me sinto à deriva e sem esperança de qualquer sentido pra continuar vendo-a.

  2. A evolução dos personagens é o ponto alto desta série. Adorei a crítica, parabéns!

  3. Cara, desculpa, mas só por que a série tem misterio, não quer dizer que ela tenta ser um Lost da vida.

  4. Bom… Adorei a 1ª Temp… Cheia de mistérios e coisas estranhas… Porém já a 2ª Temp, tão esperada.. começou meio sem graça, ao meu ponto de vista. Tudo bem que esta dando informações sobre os personagens etc, deixando migalhas aqui e ali… Mas acho que faltou mais ação… Espero que os episódios vão evoluindo conforme a série… E apesar de não gostar dos 3 primeiros da 2ª temporada, tenho o mal habito de continuar até o final, mesmo sendo uma bosta… Então.. aguardo por melhoras.

  5. que se esforça tanto pra ser uma Lost
    mesma coisa que pensei…já desisti de ver…eu até gostava da 1ª temporada, mas acabei desistindo por que eles davam tempo demais para aqueles insuportáveis adolescentes americanos…chegou uma hora que pensei “mas que $#@$ não sou obrigado a ver essa “$#$@%”…

  6. também to sentindo falta de mais ação, acontecimentos, aquela atmosfera que a primeira temporada tinha, a personalidade fervorosa do kevin que tá cada vez mais melancólico e se afundando.
    tá tudo tão morno nessa segunda temporada e eu tava esperando por algo melhor devido às críticas serem superiores às da primeira temporada

  7. Você também percebeu que a tagarelice da Patti é exagerada.
    Ela ficar aparecendo e falando o tempo todo e irrita quem assiste o episódio 4.
    Os roteiristas deveriam se dar conta disso. Na minha opinião nem deviam ter trazido essa personagem de volta à segunda temporada depois que ela cometeu suicídio.
    De resto a série vai bem, com uns tropeços aqui, outros ali.
    Continua criando expectativas, embora se torne lenta em determinados momentos.

Deixe um comentário